Espera Feliz possui em sua origem um centro histórico pouco conhecido: São Sebastião da Barra. O pequeno povoado, fundado cerca de 150 anos atrás, localiza-se a 5 quilômetros do centro da cidade e é um típico vilarejo rural do interior de Minas, com riacho, currais, igrejinha e algumas dezenas de casas rodeadas por colinas e pastagens. “A vila se iniciou em meados do século XIX, quando os primeiros desbravadores chegaram e construíram uma capela”, explica Renato Nacarati, professor aposentado e proprietário de uma chácara no local.
Um dos primeiros donos de terras na localidade foi Manoel Francisco Pinheiro que, em 1848, introduziu a cultura do café na região. Mais tarde, outros colonos vieram, como o Tenente Coronel Francisco Xavier Monteiro Nogueira da Gama, Antônio Francisco de Oliveira e Antônio Carlos de Souza.
Não demorou muito para que surgisse uma vila próspera, onde foram instalados uma escola, um armazém de alimentos, correios e um cartório de ofícios para se realizar casamentos, batizados, contratos de compra e venda, divórcios, escrituras de imóveis, certidão de nascimento e certidão de óbito. O primeiro Escrivão de Paz foi o Capitão Alexandre Pereira de Souza. “Antes, todos esses registros eram feitos no Livro do Tombo da Igreja Católica ou no cartório da cidade de Carangola. Por isso, a construção do cartório de São Sebastião da Barra, no final do século XIX, trouxe desenvolvimento para a região”, explica o professor Renato Nacarati.
Há cerca de 70 anos, muitos terrenos que pertenciam à igreja católica foram vendidos por preços baratos a duas famílias da comunidade, os Maia e os Stock. Atualmente, há uma rua no povoado habitada somente por descentes de uma dessas famílias, chamada Vila Maia. “Meu avô dizia que, à época, um padre responsável pela capela preferia ver as terras do povoado nas mãos dos mais necessitados do que sob os domínios dos ricos fazendeiros”, informa Leoni Maia Guimarães, músico residente no local e neto de um dos antigos moradores.
Todo o antigo casario, construído na época da fundação, já não existe mais, restando apenas dois exemplares. Um deles é o casarão da Fazenda São Francisco de Assis, com portas e janelas altas, colunas de braúna e telhado de barro, erguido em 1880 pela família do falecido sr. Assis Garcia. “Quando compramos a fazenda, o casarão estava em bom estado de conservação, mas precisou passar por uma reforma estrutural”, informa a advogada Karime Benelli Pelegrine, filha do atual proprietário. “Este imóvel é importante para se contar a história do município de Espera Feliz”, completa a advogada.
O outro casarão fica na Fazenda Águas Claras, também construído pela família de Assis Garcia e hoje pertencente ao empresário Antônio Xavier Filho, que passou por um longo processo de restauração, mas manteve suas características originais. “Os casarões de arquitetura colonial eram muito comuns nesse período nas fazendas dos barões do café, tanto no sul do estado quanto na Zona da Mata”, esclarece a arquiteta Juliana Padilha.
Mas no início do século XX, com o surgimento de um outro povoado onde se localiza a atual cidade de Espera Feliz, São Sebastião da Barra começou a se estagnar e, aos poucos, seu desenvolvimento foi perdendo força. Hoje, há no local uma escola da rede estadual, um campo de futebol, dois bares, uma mercearia e um posto de saúde que atende as famílias que vivem na comunidade composta por cerca de 100 casas. “Mas São Sebastião da Barra continua sendo um lugar tranquilo e aconchegante para se viver, um verdadeiro paraíso”, afirma Renato Nacarati.
A transposição da sede de São Sebastião da Barra para a atual Espera Feliz
Um dos principais fatores de desenvolvimento de Espera Feliz foi a construção da Ferrovia The Leopoldina Railway Company Limited que, em 1915, inaugurou a estação ferroviária (a atual Rodoviária Municipal, nas proximidades da Praça Cira Rosa de Assis), fazendo a ligação dos trens que vinham dos estados de Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro. Com a implantação da linha ferroviária, os moradores de São Sebastião da Barra começaram a migrar para o novo povoado, trazendo seus comércios e dando início à atual cidade.
Conta-se que esta ferrovia, anteriormente planejada para passar em São Sebastião da Barra, não foi bem vista pelos antigos fazendeiros da localidade, pois muitos acreditavam que este meio de transporte poderia trazer doenças e bandidos, além de desvalorizar as propriedades. Com isso, Espera Feliz passou a se desenvolver e, como consequência, o pequeno povoado de São Sebastião da Barra acabou sendo prejudicado, rebaixando-se à distrito. Após a transferência da sede para Espera Feliz, o cartório foi abandonado e apenas alguns antigos moradores conheceram suas ruínas. Este isolamento da vila fez com que, injustamente, suas origens se perdessem no tempo de maneira tal que, até hoje, muitos não reconhecem o verdadeiro valor de sua história.
Marcos históricos que resistiram ao tempo
Com o passar dos anos, a vila de São Sebastião da Barra sofreu grandes modificações. Contudo, ainda se pode encontrar uma belíssima igreja construída em 1902, com um coreto e uma pracinha no centro do povoado. “Esta igreja é a mais recente. A antiga ficava onde atualmente há a escola estadual da comunidade. Devido à falta de conservação, ela acabou sendo demolida”, diz Renato Nacarati.
Há também na comunidade um antigo cruzeiro feito de braúna, considerado o principal marco da fundação do povoado, que por muito tempo ficou desmontado nos fundos da escola. Originalmente instalado no alto da colina, o local era um lugar de peregrinação. “Conta-se que ao ser levado lá para cima, o padre foi conduzido sobre ele para ‘aliviar o peso’”, relata Leoni Maia Guimarães. Mas um incêndio ocorrido no pasto queimou boa parte desse cruzeiro, e o que sobrou foi trazido de volta para a vila, reconstruído e instalado em frente à antiga igreja. Hoje ele se encontra fincado ao lado da atual igreja.
Outro marco importante para a comunidade é o cemitério, que existe desde a fundação do povoado. Ele é o mais antigo da região e funciona até hoje. Quanto às outras estruturas que fizeram parte dos áureos tempos da comunidade, devido à falta de sensibilidade para se conservar o passado histórico “foram todos colocados abaixo”, conforme lamentam alguns moradores que guardam as memórias contadas pelos seus antepassados. “Sempre que vão construir alguma casa nova aqui, são encontrados pedaços de tijolo e telha de cerâmica nas escavações, provenientes das construções antigas de São Sebastião da Barra”, afirma o professor Renato Nacarati.
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Reportagem do projeto “Interventor Repórter”.
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Parceria: E.E. Interventor Júlio de Carvalho e Portal Espera Feliz.
Texto: Jayne Rosa Lábio da Silva, 16 anos, estudante do 2º ano do Ensino Médio.
Professora Orientadora: Juliana Bernardes.