ESPERA FELIZ (MG) – Faleceu na manhã deste domingo, 08, o poeta esperafelicense Nilseber Camillo de Amorim, por complicações da Covid-19. Ele tinha 73 anos e estava hospitalizado desde o dia 04 de agosto.
Segundo informações, N. C. de Amorim começou a passar mal no início da semana e precisou ser internado no Hospital de Espera Feliz, testando positivo para Covid. Ainda na quarta-feira, 04, foi removido para tratamento médico intensivo no Hospital Evangélico de Carangola. Mas, devido a agravamentos de seu quadro de saúde, o poeta não resistiu, vindo a óbito no final da manhã de ontem.
Um esperafelicense ausente
Nilseber Camillo de Amorim – ou apenas Amorim, como gostava de ser chamado – nasceu em Espera Feliz em 1948. Aos dezessete anos de idade, após o falecimento do pai mudou-se com sua mãe para o Rio de Janeiro, cidade onde exerceu diversas profissões. Foi militar do Exército e da Polícia, e depois que pediu dispensa, trabalhou como comerciante em várias empresas cariocas.
Por motivos pessoais, durante os cinquenta anos que viveu no Rio ele ficou sem vir a Espera Feliz nenhuma única vez, nem mesmo a passeio. Só retornou para sua cidade natal em 2018, onde passou seus últimos quatro anos de vida. No entanto, apesar de tanto tempo fora, dizia que sua terra sempre esteve com ele.
O poeta
Embora não tivesse formação universitária, Amorim era um homem extremamente culto. Por conta própria, realizava estudos sobre diversas áreas, como Religião, Filosofia e História, além de ser um ávido leitor de clássicos da literatura universal.
Devido à sua bagagem cultural, Amorim dedicou boa parte da vida ao ofício da escrita. Entre seus trabalhos, compôs um extenso estudo crítico a respeito da Bíblia católica, redigiu diversos ensaios sobre as escolas filosóficas ocidentais e escreveu centenas de poemas, sua grande paixão.
A maior parte de sua obra, escrita em sua máquina de escrever ao longo de mais de quarenta anos, ainda se mantém inédita, à exceção de dois livros de poesia publicados recentemente, em 2020: “Versos Sucintos” e “Poética Esperafelicense”.
Além dos textos em prosa e verso, ele também deixou dezenas de letras de samba autorais junto de seus manuscritos.
Os livros
Publicados simultaneamente, seus dois livros trazem propostas bem distintas entre si, mas ambos apresentam um apanhado geral sobre sua maneira de compreender o mundo e a vida.
Em Versos Sucintos, Amorim trabalha uma poesia altamente experimental, com estrofes no formato clássico de soneto mas com versos compostos por apenas uma única palavra – por isso o termo “Sucintos” que aparece no título.
Nesta obra o poeta trata de temas variados como religiosidade, existencialismo e quotidiano, através de uma lírica refinada e moderna.
Já em seu segundo livro, Poética Esperafelicense, Amorim faz uma espécie de homenagem à cidade onde nasceu, com poemas que retratam personagens locais, lugares e lembranças que povoaram o seu passado.
Como ele ficou cinco décadas longe de Espera Feliz, nesta obra ele evoca o seu universo de infância e juventude, de uma cidade em preto-e-branco eternizada em suas memórias. Por isso, como o livro rememora ilustres e anônimos de sua época – barbeiros, ferroviários, comerciantes, padres, pensões, cafés, carnavais, trem de ferro e uma infinidade de temas relacionados aos anos de 1950 e 1960 de Espera Feliz – este livro, em particular, não só é um tesouro da cultura literária local como também um documento histórico da cidade, uma verdadeira máquina do tempo capaz de transportar o leitor a uma Espera Feliz que não existe mais.
Um intelectual popular
Com seu jeito distinto, sempre visto de paletó e sapatos, Amorim era um homem que se destacava entre os outros, com seus cabelos grisalhos e seu porte de 1,80 metro de altura. Solteiro e cultivador da boemia romântica dos anos 50, ele era um assíduo frequentador dos bares da cidade, especialmente o Bar Boca do Povo, na praça Pedro de Oliveira, onde gostava de conversar com os amigos e recitar os versos que escrevia.
Segundo os mais próximos, ele era uma pessoa polida, de hábitos gentis e com uma pronúncia impecavelmente culta. Contudo, embora denotasse um ar de doutor em seu semblante, ele era prontamente acessível. Conversava sobre política, agricultura, poesia sem fazer distinção com quem quer que estivesse conversando.
Amorim deixou um único filho, residente na capital de Alagoas, Maceió; e sua mãe, dona Theodora Faustina de Amorim, de 96 anos, residente em Espera Feliz.
Por Farley Rocha.