Este é um artigo ou crônica pessoal de Paulo Faria.
Não se trata de uma reportagem ou opinião do Portal Espera Feliz.
Já não é nenhuma surpresa que a cada edição do Exame Nacional do Ensino Médio seja envolvida em polêmica, e isso não seria diferente em 2019. E as polêmicas sempre giram em torno de questões supostamente “ideológicas” ou do tema da redação que entra ano e sai ano é sempre considerada por muitos alunos e professores como “difícil”, “irrelevante” ou “inesperado”; mas neste ano tivemos um ingrediente a mais: como agora o Brasil vive sob a égide de um governo “fascista”, qualquer tema que caísse despertaria sem a menor sombra de dúvida a ira cacofônica dos insatisfeitos.
Mas afinal, há alguma coisa de errado com o tema “Democratização do acesso ao cinema no Brasil”? Nada. Zero. Pelo contrário, o tema é muito interessante e relativamente fácil se comparado ao tema exposto em 2018: “Manipulação do comportamento do usuário pelo controle de dados na internet”.
É clichê, mas o óbvio e o que muitos teimam em ignorar é que o problema está, na verdade, no nosso maravilhoso sistema de ensino público, pois vamos combinar: deve ser uma tortura para um aluno do Ensino Médio tentar juntar as palavras “democracia” e “cinema” e redigir um texto de 30 linhas com uma argumentação minimamente coesa se a vida inteira ele aprendeu na escola um conceito torto sobre democracia e nada sobre cinema.
Por isso, não é de se estranhar que milhares de jovens que têm no currículo apenas textos lacradores do Quebrando o Tabu, Catraca Livre e Gregório Duvivier tenham se surpreendido com o tema ou encontrado dificuldade. É só a matemática da obviedade batendo à porta.
Engana-se quem pensa que esse é um drama que acomete apenas alunos do Ensino Médio. Não é. Sem generalizações, basta visitar uma sala de aula de uma turma de Humanas, principalmente História e Sociologia, e perguntar o que é Nouvelle Vague, Cinema Novo, Boca do Lixo e quem é Truffaut. É bem provável que alguém responda respectivamente que se trata de sinônimos de novelo e tela nova, uma música da Sandra de Sá e uma palavra em francês pra designar ‘trufas’. E se tragédia pouca é bobagem, o restante que vocifera enfaticamente que o tema do Enem de 2019 “não tem profundidade” ou não cumpriu seu “papel social” faz parte da galeria dos que entoam o coro dos descontentes sobre qualquer coisa ou movimento que o atual governo faça. Já que para estes não existe salvação só resta esperar pelo choro coletivo do ano que vem.
Por Paulo Faria.
Paulo Faria é um amante do cinema de horror e rock ‘n’ roll. É professor por formação, humorista por conveniência e escritor por aspiração.