No artigo anterior, intitulado como – “a desmistificação do conceito de Política” –, o leitor foi instigado a refletir sobre conceitos capazes de ampliar a visão Política. O objetivo aqui é ir além. É trazer à tona novos conceitos e levar o leitor a construir ideologias sobre “Políticas Públicas e Gestão das Cidades”. Temas importantíssimos que, se bem absorvidos, poderão contribuir com a melhoraria da qualidade de nossos representantes e, consequentemente, com a qualidade dos serviços prestados por eles. Prosseguindo com nossas reflexões, vamos falar sobre a “tipologia clássica das formas de poder” e as influências do “poder” sobre o comportamento das pessoas.
Aristóteles formulou a tipologia clássica das formas de poder com base no interesse em favor do qual o poder é exercido. Assim temos: o poder paterno – exercido pelo pai sobre o filho no interesse do filho, o poder despótico – exercido pelo senhor sobre o escravo no interesse do senhor e, o poder político – exercido pelos governantes sobre os governados no interesse de ambos.
Aristóteles considera apenas três dos quatro elementos: sujeito, objeto e fim, deixando de lado o meio, que somente será considerado na tipologia moderna. O poder paterno é exercido no interesse do objeto de seu exercício – o filho –, o poder despótico, exercido no interesse do sujeito que o exerce – o senhor –, e o poder político, no interesse do sujeito e do objeto – governantes e governados.
Entre as três formas de poder da tipologia clássica, o poder político é, sem dúvida, o mais complexo, pois é exercido no interesse dos dois agentes envolvidos na relação – sujeito e objeto/governantes e governados – e não do lado de um só deles – sujeito ou objeto.
Diante dessa definição aristotélica de poder político, você certamente irá se perguntar: será que Aristóteles acreditava que o poder político seria, sempre, exercido no interesse de governantes e governados?
A resposta é não. Para Aristóteles, o poder político deve ser exercido no interesse de ambos, mas nem todos os governos o exercem dessa forma. Aristóteles era bem consciente de que alguns – na verdade, muitos – governantes exercem o poder no seu próprio interesse, tal como o senhor exerce o poder sobre os seus escravos, isto é, despoticamente, e não no interesse de ambos, como deveria ser. Para dar conta desse problema, Aristóteles criou outra tipologia – a das formas de governo – cujo critério de classificação seria o mesmo da tipologia das formas de poder, ou seja, a finalidade – interesse – do exercício do poder dos governantes sobre os governados.
A tipologia aristotélica das formas de governo agrega uma variável a mais à tipologia das formas de poder – o número de governantes – porém segue dividida em três categorias: o governo de um só (Monarquia e Tirania); o governo de poucos (Aristocracia e Oligarquia); e o governo de muitos (Politeia e Democracia).
Para Aristóteles, o bom governo é sempre orientado para satisfazer o interesse de todos – governantes e governados – podendo ser exercido: por um só indivíduo, o rei, no caso da monarquia; por uma minoria, os melhores, no caso da aristocracia; ou pela maioria, no caso da politeia, que significa o governo da pólis – cidade-Estado.
Já o mau governo, isto é, as formas de governo degeneradas, é sempre orientado para satisfazer o interesse do(s) governante(s) e também pode ser exercido: por um só indivíduo, isto é, pelo tirano, que exerce o poder em seu próprio interesse, em detrimento dos interesses dos governados, no caso da tirania; por uma minoria, isto é, pelos mais ricos, que exerce o poder em seu próprio interesse, em detrimento dos interesses da maioria mais pobre, no caso da oligarquia; ou pela maioria que exerce o poder em seu próprio interesse, em detrimento dos interesses da minoria, no caso da democracia.
Ao analisar a tipologia das formas de governo de Aristóteles, precisamos ter bem claro que o termo democracia tinha, na antiguidade, um significado muito diferente do que tem hoje. No tempo de Aristóteles, democracia significava tirania da maioria sobre a minoria, mas a partir do século XX passou a ser entendido como o governo da maioria que respeita os direitos da minoria.
Na sua formulação mais geral e abstrata, “o poder faz referência à capacidade que um indivíduo, ou grupo de indivíduos, tem de influenciar o comportamento de outras pessoas”. O poder não é algo material – como o ouro, as terras, o trigo ou a água – ou seja, não é um bem ou um recurso do qual os indivíduos possam se apropriar. Recursos e bens são meios que podem e, frequentemente, são utilizados pelos seus detentores para influenciar o comportamento de outras pessoas, todavia não se confundem com o poder em si próprio.
Precisamos ter em mente que o poder não se detém, mas se exerce.
Assim, quando dizemos que uma pessoa é poderosa, estamos nos referindo à influência que ela exerce sobre o comportamento de outros indivíduos, e não aos instrumentos e bens de que ela dispõe.
Uma pessoa pode deter muita riqueza e dinheiro sem exercer, por esses meios, influência sobre o comportamento de outrem. Esta pessoa pode certamente ser considerada rica, mas não poderosa.
Um indivíduo dotado de grande força física ou munido de muitas armas, mas que não as utiliza para influenciar o comportamento dos outros, deve ser, certamente considerado forte, mas não poderoso.
Da mesma forma, uma pessoa que tenha cultura muito ampla e uma inteligência muito grande, mas não as utiliza para influenciar o comportamento das demais, só pode ser considerada culta e inteligente, mas não poderosa.
Portanto, o que define o poder é o seu exercício e sua influência sobre o comportamento das pessoas. E como todo poder é sempre exercido por determinados meios, esses meios tornam-se fundamentais na definição moderna dos tipos de poder.
No próximo artigo analisaremos sobre a tipologia moderna das formas de poder.
Fonte: Coelho, Ricardo Corrêa. Ciência política. Departamento de Ciências da Administração / UFSC; [Brasília], CAPES : UAB, 2010. 159p.:il.
Por Nilton Martins.