Farley Rocha

Este é um artigo ou crônica pessoal de Farley Rocha.
Não se trata de uma reportagem ou opinião do Portal Espera Feliz.

Foo Fighters no Maracanã

Uma apresentação do FF nos faz sentir na alma e no coração o verdadeiro significado da palavra DIVERSÃO.

Publicado em 07/03/2018 - 10:33    |    Última atualização: 07/03/2018 - 10:33
 

Aos queridos Paulinha Gomes, Cesar Augusto e Marley

É domingo e é Rio de Janeiro. Estamos na sala de um sobrado dos anos 50 na Tijuca, Zona Norte da cidade. Samba, rock e MPB ecoam da JBL portátil e preenchem o ambiente entre vozes de sotaques mineiro e carioca da galera que gargalha enquanto faz selfies – ao fundo de cada foto, latas de cerveja, Red Bull e cinzeiros sobre a mesa denunciam o motivo da reunião: é o esquenta antes do show do Foo Fighters, no Maraca!

Devidamente sorridentes e alegres, despedimo-nos do Marley (o cão gentefina do casal anfitrião) e trancamos a porta em direção à rua, onde o Uber nos aguarda.

Chegamos ao estádio juntamente com o cair da noite abafada. Unimo-nos à horda de fãs que caminham rumo aos portões de entrada sem darmos conta de que centenas de PMs e viaturas coruscantes fazem a nossa escolta em uma cidade sitiada pelo crime que já atinge níveis absurdos de organização.

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Adentramos o gramado da arena sagrada do futebol no exato instante em que Queens Of The Stone Age – a banda californiana que faz a abertura da turnê sul-americana do FF – inicia sua apresentação com If I Had A Tail. Depois disso é só pedrada em cima de paulada. Os integrantes do QOTSA, entre bastões de led e uma turva fumaça de gelo seco, fazem reverberar para fora das gigantescas abóbadas do Maracanã 1:15h do melhor stoner rock que a Cidade Maravilhosa já ouviu: My God Is The Sun, No One Knows, The Lost Art of Keeping a Secret e a incrível I Sat by The Ocean aquecem o corpo e os tímpanos dos quase 50 mil espectadores que aguardam o melhor que esta noite ainda tem a oferecer.

Mais tarde, pontualmente às 21:30h Dave Grohl se posiciona no centro do palco de oito metros de altura, acompanhado de sua banda norte-americana que tem até corpo de baile com três backing vocals femininas na retaguarda e entoa Run, a música de trabalho do último disco do grupo, arrebatando o público a um êxtase sincronizado de assovios e palmas em gesto de boas-vindas.

Então o calor do Rio torna-se uma brisa fresca comparada à temperatura flamejante do show dos caras. A pegada rock’n roll deles é tão impactante e digna dos grandes concertos do gênero que não há quem não se contagie a cada refrão escrachado de guitarras pesadas e repiques de uma bateria tão precisa quanto ensurdecedora sob o comando do cabeludo Taylor Hawkins.

Mesmo o estádio não estando com lotação máxima – como é comum em shows como este – o público não deixa por menos e acompanha, a plenos pulmões, a garganta vulcânica do frontman Grohl ao executar cada música em cima do palco, que resplandece em canhões de luz, telões digitais e raios lasers mirando os céus cariocas. Por isso, The Pretender, Learn to Fly, These Days e Walk ganham um peso monumental ao serem cantadas em uníssono pela multidão desvairada que suspende smartphones e plaquinhas num flashmob emocionante ao repetir Oh! Oh! Oh! por todo o gramado e arquibancadas ao som de Best of You.

Mas é no refrão de My Hero que nossas vozes atingem significados – ainda que inconscientemente – de um grito de liberdade, como se uma parcela do povo brasileiro (representada aqui por esta plateia) clamasse pelo surgimento de um herói nacional capaz de salvar o país da lama na qual se afunda. Um alarido que de início é abafado pelos sintetizadores das caixas de som, aos poucos torna-se um tsunami de berros de milhares de vozes repetindo o mesmo brado “fora, Temer! fora, Temer!”, num repentino arroubo de consciência política e anseio por mudanças.

Não obstante, o clima sisudo de uma meia manifestação de protesto é quebrado pela irreverência e carisma do Dave Grohl que, entre uma música e outra, faz palhaçadas com suas típicas caretas em destaque nos telões e diz frases cômicas que quase sempre terminam em “fuck you this night!” ou “mother fuck, yeah!”

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Mesmo que um evento dessas proporções nos custe financeiramente caro e nos deixe sujeitos a empurrões, cotoveladas, pisões e desagradáveis flatulências anônimas provenientes da moda “ovo cozido e batata-doce”, uma apresentação do FF nos faz sentir na alma e no coração o verdadeiro significado da palavra DIVERSÃO. Talvez seja por esse mesmo motivo que o grupo se mantem no topo há 24 anos como uma das melhores bandas do mundo.

Assim, à meia-noite em ponto, e após quatro bônus oferecidos pelo bis, despedimo-nos da trupe do FF e do gramado do Maracanã com as pernas e quadril moídos, mas com o espírito leve e a mente tão inebriada quanto só um espetáculo como este é capaz de proporcionar.

Porque assistir Foo Fighters ao vivo é muito mais que presenciar um show de rock. É estar em uma grande festa onde música legal é a regra – e não a exceção.

Por Farley Rocha.

Sobre Farley Rocha

Farley Rocha é professor, fã do Radiohead e do Seu Madruga. Já plantou uma árvore, escreveu um livro e edita o blog http://palavraleste.blogspot.com


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