Este é um artigo ou crônica pessoal de Farley Rocha.
Não se trata de uma reportagem ou opinião do Portal Espera Feliz.
Há três semanas, os integrantes da banda Help Rock me encomendaram um texto para a abertura do show de réveillon no Rancho Pico da Bandeira. Para quem não esteve presente na festa, segue abaixo o resultado.
(p.s. O último parágrafo é baseado na letra de Tempos Modernos, do Lulu Santos, já que foi esta a primeira música do show)
Crônica de Ano Novo
Desde que se fez da escuridão, luz, e do silêncio, som, a existência das coisas é a matéria do tempo. A vida fossilizada na superfície dos séculos, a história estampada na porosidade da pele e as explosões de estrelas que já morreram são meios que o tempo encontra para dizer a que veio: implacável demolidor de futuros, inevitável construtor de passados.
Da descoberta primitiva do fogo à invenção sofisticada da pólvora, é o tempo o senhor dos homens e do universo, esta máquina de transformar dias em noites, cidades em ruínas, mares em desertos. Mas como somos nós a consciência que o tempo tem de si mesmo, tentamos instintivamente controlá-lo com as rédeas da razão como se amansássemos o coração de um animal selvagem.
Fabricamos relógios, calendários e estações, inventamos escalas, números e ponteiros num esforço descomunal para se compreender o tempo. Mas fotografias que fazemos, histórias que escrevemos e aniversários que contamos não passam de obsoletos artifícios humanos para tentar contê-lo. De resto, tatuado na memória acumulada de nossas lembranças, fica-nos apenas o mapa do que vivemos na linha do tempo desenhada em nosso peito.
Por isso, na impossibilidade de desacelerar seu curso ou de recalcular a rota de sua trajetória incerta, que pelo menos façamos do tempo pincel e tinta na aquarela da vida, dos minutos versos nos poemas da alegria, das horas pássaros sobrevoando encantos, dos dias árvores desfolhando sorrisos e dos anos sóis iluminando eternidades.
Porque não há tempo que volte. Assim como não há hoje que se repete. Que a cada instante, vivamos tudo que há pra viver. E, para isso, que possamos nos permitir… neste novo ano prestes a acontecer.
Por Farley Rocha.
Farley Rocha é professor, fã do Radiohead e do Seu Madruga. Já plantou uma árvore, escreveu um livro e edita o blog http://palavraleste.blogspot.com