Este é um artigo ou crônica pessoal de Enrique Natalino.
Não se trata de uma reportagem ou opinião do Portal Espera Feliz.
Estamos em mais um ano eleitoral e o país começa a contagem regressiva para a escolha do próximo Presidente da República, de Governadores, Senadores e Deputados Estaduais e Federais. Partidos e candidatos se revezam nos programas políticos na televisão e nas viagens por regiões e cidades em busca do apoio e do voto dos cidadãos. Estes, por sua vez, vivenciam, em maior ou menor grau, o difícil exercício de avaliar e escolher seus governantes e representantes para o próximo período de quatro anos, inventariando feitos e analisando expectativas. Além dos candidatos, dos partidos e das instituições, a própria atividade política também passa a ser avaliada.
A valorização da política, conjugada com o fortalecimento da participação social, base de um Estado Democrático de Direito, é fundamental para a melhoria da governança em nossa sociedade. A despeito dos importantes avanços institucionais verificados desde no Brasil desde a redemocratização, o enfraquecimento dos partidos, a forte dependência entre poder político e poder econômico e a deterioração dos costumes produzidos pelo sistema político criaram fortes barreiras à oxigenação de lideranças e à atração das melhores inteligências do país para a arena pública.
No sistema republicano, presidencialista e federal brasileiro, a distância entre o país ideal e o país real é bastante grande. De difícil compreensão para a maioria dos brasileiros, o nosso sistema político mostra sua crescente esclerose e quase falência diante dos grandes desafios que se apresentam a uma nação continental, com mais de 200 milhões de habitantes, com uma das maiores economias mundiais e com uma sociedade cada vez mais heterogênea e complexa, tornando-se, pelas suas falhas, inconsistências e vícios, vitualmente incapaz de garantir uma combinação razoável de governabilidade, de representatividade e de probidade.
A crise na representação, por outro lado, abre a oportunidade para a mudança. De quando em quando, o país exige uma renovação de lideranças e a escolha de novos caminhos, o que se faz, segundo a lição dos mais sábios, combinando o frescor da juventude com a experiência da maturidade. Em seu livro “Cartas a um Jovem Político“, de 2007, um exercício inédito de aconselhamento sobre a atividade política, em tom direto e coloquial, Fernando Henrique Cardoso afirma que não há ação política sem coragem para enfrentar resistências, talento para ouvir opiniões distintas, visão de futuro e capacidade de tomar decisões firmes.
Na lição de Cardoso, num cenário que combina, de um lado, normalidade institucional e democrática, e de outro, crescente desconfiança e indiferença da sociedade em relação ao mundo político, precisamos refletir cada vez mais sobre os limites, possibilidades e desafios da vida pública. Como ensina o sociólogo alemão Max Weber em sua obra “Política como Vocação”, a atividade política requer o equilíbrio das convicções com as circunstâncias políticas do momento, segundo a ética da responsabilidade. E, se por um lado a política envolve um “viver perigosamente”, por outro os riscos inerentes ao seu exercício devem ser administrados com a aquisição de mais conhecimentos e a ponderação das opiniões alheias, tornando os homens públicos capazes de ampliar a compreensão da realidade e tomar decisões mais acertadas.
O exercício do jogo do poder, em sua essência, não mudou muito ao longo de séculos e séculos de história humana, pois a própria natureza humana permanece a mesma. Num outro diapasão, com a ascensão das sociedades de massa, a abertura das fronteiras nacionais à globalização, a reformulação dos papéis dos Estados nacionais, o surgimento de demandas e agendas sociais cada vez mais especializadas e a emergência das novas tecnologias de comunicação e informação, o modo com que exercemos e vivenciamos o controle do poder nas modernas democracias passa por um período de transformação sem precedentes. Entender essas transformações, compreender o seu significado e possibilitar a maximização do controle sobre os nossos destinos são desafios que se apresentam aos homens públicos da nessa era, especialmente num ano de escolhas críticas como esse.
Enrique Carlos Natalino é doutorando em Ciência Política na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e mestre em Administração Pública pela Escola de Governo da Fundação João Pinheiro. É graduado em Direito na Universidade de São Paulo (USP). É professor-colaborador do Instituto de Ciências Econômicas e Gerenciais da PUC-Minas. Foi pesquisador-visitante do German Institute of Global and Area Studies (GIGA), na Alemanha. Co-edita o blog de Política Internacional Fora da Cadência (www.foradacadencia.com).